Ela acordou com uma certa esperança naquele domingo. Não uma esperança qualquer, mas aquela como a de uma criança que tem certeza do gosto doce do algodão doce que derrete na língua e espalha-se pela boca. Aquele gosto quente e terno, sensação de aconchego, talvez induzido pelo céu de tons rosáceos com que o dia amanheceu ou pelo consolo do sol e a convicção do novo ao vislumbrar o horizonte pela janela dos sonhos. A criança tem certeza de que não provará nada mais prazeroso que aquele algodão doce.
Fez uma limpeza em sua casa, a fim de eliminar qualquer vestígio de dor que pudesse encontrar. Em vão. Mas encontrou um vão, onde estavam armazenadas as sujeiras mais sórdidas, restos que já foram belos e vivos, mas hoje não passavam de cadáveres. Já haviam sido cremados, mas insistiam em estar ali... As cinzas. O dia de conSOLado tomou forma de combustão e explodiu em chuva, tão cinza chumbo estava.
A esperança foi-se embora de mansinho, acho que até que continuou por ali, à espreita, apoderando-se de novo de um corpo de ossos emoldurados por uma carne quente, inquieta, dolorida, cansada, flácida de tanto assumir uma função que não era a sua (a saber, amar). Então um hierofante que veio visitar-lhe lembrou-lhe de que o coração é um músculo, portanto, mais rijo que suas ancas, mais forte e mais suscetível à dor. Neste momento uma lágrima quente e AMARga, escorreu-lhe da face à procura do MAR... Era mais uma vez, a esperança... mas ela desejava que esta fosse embora, pois já não lhe servia mais...
Então entregou-se novamente à janela dos sonhos e ficou por lá... até que outro algodão doce viesse derreter em sua boca...